terça-feira, 29 de janeiro de 2013

Papo de Gente Grande


Lá pelos meus 7 ou 8 anos, eu adorava brincar de ser mocinha. Botava o cabelo pro lado e chamava de penteado. Sentava com as pernas cruzadas e me sentia educada. Sorria e empinava o nariz toda hora e chamava de independência. Fingia que falava no telefone pra achar que todos os meus namorados precisavam de mim.
Daí lá pelos meus 15 ou 16 anos, eu adorava brincar de rebelde. Botava o cinto de rebite, ouvia músicas que ninguém entendia de tão barulhentas e me recusava a me divertir em reuniões de família. Um namorado ou outro, mas que não se encaixassem em nada do que queriam pra mim.
De lá pra cá, acho que passei de um extremo ao outro justamente porque meu comportamento e personalidade mudaram, mas não a crença. No fundo, eu sempre achei que tudo fosse ficar naturalmente bem. Rebelde ou mocinha, eu chegaria aos meus 20 e poucos com um relacionamento estável, bem formada, com uma carreira linda pela frente, com filhos, viagens...naturalmente feliz, como deve ser.

Mas agora de verdade nos meus 20 e poucos anos... o que é natural mesmo? 
Não sou mocinha. Não sou rebelde. Não tenho um relacionamento estável. Bem formada, mas nem ideia da carreira à minha frente. Filhos bem mais tarde, obrigada. Algumas viagens por vir, se Deus quiser. 
"Que burra", diriam as minhas antigas Grazis. Eu fui contra a ordem das coisas. Minhas escolhas, as que eu achei que me levariam a o quê eu considerava natural, só me levaram ao outro lado do labirinto. O que antes pareciam escolhas pensadas e calculadas, agora mais parecem um jogo de sorte ou azar, par ou ímpar, tentativa e erro. Não há nenhuma garantia de que um caminho seja melhor ou mais rápido que qualquer outro.

Por outro lado, acho que nem eu mesma acreditava que teria estrelas tão brilhantes para me guiar nesse caminho labiríntico. Sei que elas vão me nortear, sei que elas não vão deixar de brilhar não importa onde eu esteja. Sei que há uma luz maior iluminando-as pra mim. Sei que não estou sozinha.
Obrigada à minha família, meus amigos e a Deus, por me mostrarem que não há felicidade mais natural no mundo do que a de tê-los ao meu lado.

sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

Carta ao Coração

É fácil perder a cabeça. Difícil é manter todos os membros em seu devido lugar, e não ser todo ouvidos ao coração.
Tá na hora do coração ouvir.

Você, querido coração, precisa sossegar.
Sei que você está acostumado a bater descontroladamente por alguém, mas não dá pra ser assim toda hora. Para bater de verdade por outra pessoa, você precisa entender algumas coisas que ainda não entendeu.
Precisa entender que muitas outras pessoas e coisas e lugares podem te disparar. E não é porque você está em disparada que tem que mandar a razão pra aquele lugar. Não, ela não quer te limitar ou te impedir de viver. A razão só não quer que você queira crescer sozinho, até porque isso é impossível. A queda será sempre inevitável. Ela sabe que só juntos vocês vão evoluir. 
No desespero de viver todo dia como se fosse o último, você deixa de ver que sua grande parceria está bem ao seu lado. Vocês podem mais juntos. Podem realizar tudo que você sempre sonhou. Podem ir além do que os dois sozinhos imaginariam.

Mas é preciso que não sejas egoísta. É preciso paciência. É preciso calma. 
É dar um passo para trás para finalmente poder dar milhares para frente.
Não tenha medo.
A razão não vai te boicotar.
Ela te ama tanto quanto eu.

sexta-feira, 11 de janeiro de 2013

Crônica de voo

Aeroportos já são lugar comum pra mim. Freqüento esses saguões há 6 anos, desde que me mudei pra Porto Alegre. Esperei meses para estar aqui esperando esse avião. Não é fácil ficar longe da família, principalmente quando meu mundo parecia desmoronar perante meus olhos. Mas sobrevivi para estar aqui vendo esse céu azul pela janela. Que alívio.
"Atenção senhores passageiros do voo 3567 com destino a São Paulo Congonhas..."
Engraçado ver essas pessoas na fila ansiosas por embarcar  mesmo com assento reservado. Mas pra quem já esperou dias que pareciam semanas, alguns minutos não vão matar ninguém. Me permito observar um pouco mais o azul envidraçado.

Logo estamos decolando. Tudo parece tão minúsculo daqui de cima. Ou lá de longe. É tudo uma questão de ponto de vista. E Deus sabe o quanto meu ponto de vista mudou nos últimos anos. Mas tanta vista me cansa os olhos e não demoro a pegar no sono. Nuvens enormes preenchem a paisagem do meu sonho. Nuvens vermelhas escarlate, vibrantes, mas que repentinamente adquirem uma cor turva, cor de nada, mas que me lembra todos os cemitérios que já visitei. E essas nuvens se movem, lenta e precisamente, como um animal se preparando para o ataque. Mas antes de dar o bote, rostos se formam dizendo frases que não consigo entender. Como uma língua desconhecida, entendo apenas palavras como "desculpe", "não posso", "fica", "vai", "sempre", "nunca"...

"Senhores passageiros, estaremos servindo refrigerante e barras de cereal."
Acordo numa baque assustada, assustando também meu colega de assento. Tudo isso pela barrinha de cereal. E ainda dizem que deveria agradecer por não pagar a mais por isso. 
Abro a janela e me deparo com mais nuvens. Mas essas agora brancas, laranja avermelhadas, se despedindo dos últimos raios de sol. É realmente o fim de um ciclo. Mesmo com todas as tempestades, não posso negar as luzes que Porto Alegre me ofereceu. Sem meus amigos, me trabalho, meus amores, minhas decepções, minhas dores... Não seria metade da mulher de que me orgulho ser. O lanche até que me cai bem.

Perdida em minhas lembranças, me surpreendo quando a comissária anuncia: "senhores passageiros, sejam bem-vindos a São Paulo". Fico boquiaberta. Sou bem-vinda. Estou em casa. Voltei. Não achei que voltaria assim. Não achei que voltaria sozinha. Mas também não imaginei que voltaria tão forte, tão realizada, tão minha.
É inacreditável perceber as dez mil voltas que a vida dá, mas ainda me deixando de pé. Bem, não literalmente de pé, já que nem minhas pernas acreditam que tá na hora de juntar minhas malas e levantar. É surreal pensar em redescobrir velhos caminhos e ao mesmo tempo procurar por novos que também estão ansiosos para me conhecer.
Chegou a hora. Sem atrasos. Sem escalas.
"Boa noite, boa estada".
Obrigada. De coração.