sexta-feira, 11 de janeiro de 2013

Crônica de voo

Aeroportos já são lugar comum pra mim. Freqüento esses saguões há 6 anos, desde que me mudei pra Porto Alegre. Esperei meses para estar aqui esperando esse avião. Não é fácil ficar longe da família, principalmente quando meu mundo parecia desmoronar perante meus olhos. Mas sobrevivi para estar aqui vendo esse céu azul pela janela. Que alívio.
"Atenção senhores passageiros do voo 3567 com destino a São Paulo Congonhas..."
Engraçado ver essas pessoas na fila ansiosas por embarcar  mesmo com assento reservado. Mas pra quem já esperou dias que pareciam semanas, alguns minutos não vão matar ninguém. Me permito observar um pouco mais o azul envidraçado.

Logo estamos decolando. Tudo parece tão minúsculo daqui de cima. Ou lá de longe. É tudo uma questão de ponto de vista. E Deus sabe o quanto meu ponto de vista mudou nos últimos anos. Mas tanta vista me cansa os olhos e não demoro a pegar no sono. Nuvens enormes preenchem a paisagem do meu sonho. Nuvens vermelhas escarlate, vibrantes, mas que repentinamente adquirem uma cor turva, cor de nada, mas que me lembra todos os cemitérios que já visitei. E essas nuvens se movem, lenta e precisamente, como um animal se preparando para o ataque. Mas antes de dar o bote, rostos se formam dizendo frases que não consigo entender. Como uma língua desconhecida, entendo apenas palavras como "desculpe", "não posso", "fica", "vai", "sempre", "nunca"...

"Senhores passageiros, estaremos servindo refrigerante e barras de cereal."
Acordo numa baque assustada, assustando também meu colega de assento. Tudo isso pela barrinha de cereal. E ainda dizem que deveria agradecer por não pagar a mais por isso. 
Abro a janela e me deparo com mais nuvens. Mas essas agora brancas, laranja avermelhadas, se despedindo dos últimos raios de sol. É realmente o fim de um ciclo. Mesmo com todas as tempestades, não posso negar as luzes que Porto Alegre me ofereceu. Sem meus amigos, me trabalho, meus amores, minhas decepções, minhas dores... Não seria metade da mulher de que me orgulho ser. O lanche até que me cai bem.

Perdida em minhas lembranças, me surpreendo quando a comissária anuncia: "senhores passageiros, sejam bem-vindos a São Paulo". Fico boquiaberta. Sou bem-vinda. Estou em casa. Voltei. Não achei que voltaria assim. Não achei que voltaria sozinha. Mas também não imaginei que voltaria tão forte, tão realizada, tão minha.
É inacreditável perceber as dez mil voltas que a vida dá, mas ainda me deixando de pé. Bem, não literalmente de pé, já que nem minhas pernas acreditam que tá na hora de juntar minhas malas e levantar. É surreal pensar em redescobrir velhos caminhos e ao mesmo tempo procurar por novos que também estão ansiosos para me conhecer.
Chegou a hora. Sem atrasos. Sem escalas.
"Boa noite, boa estada".
Obrigada. De coração. 

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