quarta-feira, 23 de abril de 2014

Sombras

Nesse último feriado de Páscoa, encarnei o melhor espírito aventureiro com meus amigos e explorei algumas cavernas do PETAR. O parque do interior de SP é simplesmente a maior concentração de cavernas da América Latina, sendo trezentas no total.
Nas seis cavernas que pude visitar, a minha parte preferida sempre era o "apagão": em algum lugar entre a próxima subida e a próxima pedra que você vai escorregar, todo o grupo arranja um lugar pra sentar e apagar suas lanternas. A escuridão é absoluta, o silêncio parece ser palpável e a sensação de isolamento é única; nada mais existe além de você mesmo. É um momento incrível, mas não deixa de ser um pouco assustador pra algumas pessoas.
Tentando dar sentido a essa sensação tão contraditória, me lembrei daquele mito da caverna do Platão. Ele dizia que a falta de percepção do ambiente em que estamos, que vai muito além das sombras que conseguimos enxergar nas paredes da caverna, deturba nossa noção de realidade e nos isola muito mais do que a caverna em si.
Voltando da aula de história em flashback, fiquei pensando na minha própria noção de sombras e realidade.
Por que a gente tem tanto medo de escuro, de silêncio, de si mesmo?
Onde tudo é luminosidade, pouco me questiono. É tudo previsível, sob controle e sabido. Quanto mais luz, melhor. Quando falta energia, quando meus olhos precisam se ajustar para enxergar qualquer vislumbre, a sombra vem a tona. E, com ela, também tudo que eu não quero ver, que ignoro e fujo pra longe. Do contraste entre luz e sombra, minha realidade interna não tem por onde se esconder, tornando claros meus defeitos e minhas qualidades sem distinção.
Não discordo de Platão, mas ouso acrescentar que pior que perder a noção de ambiente ou de sociedade é perder a noção de si mesmo. A partir do auto-conhecimento, sou capaz de aceitar e compreender minha condição atual que, por ser naturalmente passageira, não gera acomodação. E dessa compreensão surge a transformação, que então pode compreender e ajudar a transformar outros à minha volta, modelando também o ambiente em que vivemos.
A escuridão, o silêncio e o isolamento não devem ser temidos, da mesma maneira que não devemos temer a nós mesmos. Conhece-te a ti mesmo, e a luz se propagará.

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